segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

CIDADE DE FRENTE PARA A BAÍA DE GUANABARA - Projeto do Porto Maravilha devolve a prédios históricos a vista do mar


Os fundos da Casa França-Brasil (construção baixa ao centro) e a antiga fachada da frente da Candelária terão, após o fim das obras, a vista privilegiada para a Baía, antes encoberta pela Perimetral, que foi derrubada - Genilson Araújo / Parceiro / Agê / Genilson Araújo


Ludmilla Lima

Candelária volta a ficar de frente para a Baía de Guanabara

RIO — Uma das construções mais emblemáticas do Rio, a Candelária passou meio século de costas para a cidade e com sua visão para o mar comprometida pelo Elevado da Perimetral. Quando a Avenida Presidente Vargas foi aberta, em 1944, até cogitou-se “girar” a orientação da fachada e das torres da igreja, como conta a historiadora Myriam Andrade Ribeiro. Só que agora, como um giro na história, a Candelária se prepara para se reencontrar com a Baía de Guanabara. O motor é a Orla Prefeito Luiz Paulo Conde, entre as imediações do Museu Histórico Nacional e o Porto, que vem “revirando” o Centro da cidade para o mar.

A poucos metros da Candelária, a Casa França-Brasil é um caso emblemático. Lá, será feito mais ou menos o que se pensou para a Candelária décadas atrás: a entrada principal, hoje para a igreja, será voltada para a promenade, espaço destinado a caminhadas. O acesso será feito por um portal que dava diretamente no píer, no século XIX. Na época, o prédio funcionava como alfândega — nome que continua registrado sobre essa entrada, escondida por um muro localizado nos fundos e que será demolido, integrando a construção histórica ao novo percurso.

Marcus Wagner, diretor de projetos da Oca Lage, organização social gestora da Casa França-Brasil, diz que, na prática, o público que visitar a instituição poderá circular entre os dois lados, o que antes era impossível:

— Essa é uma obra que vai modificar a região inteira. E a Casa França-Brasil é um caso particular pela importância histórica. É um prédio de Grandjean de Montigny, que veio com a missão artística francesa. O peso histórico da casa é grande, mas ela acabou sendo a mais prejudicada pela Perimetral. Com o elevado, a construção ficava completamente isolada, e à sua sombra.

Ele adianta que a ideia é abrir ao máximo para a rua a construção, que se destaca pela simetria, com portas nas quatro fachadas.

— O público terá uma percepção singular da casa, já aberta pelos três lados. Faltava a quarta entrada. Essa abertura para a Baía ressignifica toda a história, inclusive a da formação do Centro — comemora Marcus Wagner.

Projetado a pedido de Dom João VI e inaugurado em 1820, o prédio abrigou primeiro a Praça do Comércio, sendo voltado para a Candelária. Em 1924, Dom Pedro I transformou o lugar em alfândega.

— É uma arquitetura neoclássica, que vem no século XIX com força e tem o sentido de recuperar uma simplicidade e uma verdade funcional. É um edifício da estrutura econômica do estado, e essa arquitetura tem toda essa significação cultural, política e econômica — explica a arquiteta Cêça Guimaraens, diretora cultural do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-RJ). — O resultado da derrubada da Perimetral é inevitavelmente a valorização desses edifícios, que terão uma frente marítima. Mas é preciso prestar atenção se a orla aberta será para o pedestre passear. O importante é que ela seja uma promenade.


O projeto da esplanada arborizada que será criada desde o mar até a Igreja da Candelária - Divulgação


O arquiteto e urbanista João Pedro Backheuser, um dos autores do projeto da orla, responde que, sim, o espaço será voltado para o pedestre. Ele explica que a Casa França-Brasil, o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) e o Centro Cultural dos Correios passarão a ocupar um espaço único, totalmente interligado a uma praça junto à orla. No caso da Candelária, a visão para a Baía será livre de obstáculos:

— Será criada a Esplanada da Candelária, com dois jardins laterais. Esse espaço verde destacará a visão da igreja e, nas duas laterais, teremos bancos para os pedestres — diz o arquiteto, que defende a tese que a nova orla vai virar o Centro “ao contrário”. — A cidade vai recuperar esse contato com a Baía, que foi rompido. E os edifícios voltarão a ter protagonismo no espaço.

Para ele, o percurso de três quilômetros permitirá um passeio por quatro séculos de história, com a integração dos elementos, sendo o mais novo o Museu do Amanhã. O arquiteto ressalta que uma das construções mais antigas do Rio de Janeiro, o Mosteiro de São Bento, poderá ser apreciado, já que a fachada ficava escondida pela Perimetral (sendo que nem de costas ele podia ser visto...). No ritmo das mudanças no entorno, a velha construção do século XVII está em obras. Toda a sua fachada passa por um minucioso processo de restauração, acompanhado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

RESTAURAÇÃO CUIDADOSA

Claudia Nunes, conservadora e restauradora do Iphan, explica que foi feito um estudo sobre os componentes da argamassa usada nas paredes, para que o material aplicado na reforma fosse o mesmo de quatro séculos atrás. A cantaria também está sendo recuperada. Quando a orla for aberta à população, entre março e abril do ano que vem, o mosteiro já estará todo branquinho.

— As pessoas poderão ter um pouquinho da visão do que era o Rio no século XVII — diz .

A historiadora Myriam Andrade Ribeiro, autora com Fátima Justiniano de “Barroco e rococó nas igrejas do Rio de Janeiro” (Programa Monumenta/Iphan), brinca que, para o mosteiro, também é um presente dos céus:

— Os monges vão poder enxergar das suas celas a Baía. Antes, ficavam vendo a Perimetral. Acho que essa mudança foi de tanto eles rezarem.

O caso da Candelária não é diferente. Igreja de estilo pombalino, ela seguia o padrão dos templos em Lisboa no século XVIII.

— Nas cidades portuguesas, o normal é a igreja olhar em direção ao mar — comenta ela. — Ainda bem que o projeto de fazer o giro da fachada e das torres da Candelária, por causa da Presidente Vargas, não foi adiante. Com essa obra de recuperação da orla, a igreja vai encontrar novamente o mar.

João Pedro Backheuser diz acreditar no processo de valorização de outros edifícios na futura orla. Essa onda, defende, contaminará positivamente também imóveis privados cujas fachadas ainda denunciam os anos de decadência em que estiveram mergulhados:

— O espaço público é um motor para que o espaço privado gere renovação e investimento.

INVESTIMENTOS NA ÁREA SOMAM R$ 8 BILHÕES

Programa de revitalização urbana que soma R$ 8 bilhões em investimentos, o Porto Maravilha começou a ser implementado em 2009, quando foi criada por lei a Operação Urbana Consorciada da Área de Especial Interesse Urbanístico da Região Portuária do Rio de Janeiro. A região de cinco milhões de metros quadrados, que tem como limites as avenidas Presidente Vargas, Rodrigues Alves, Rio Branco e Francisco Bicalho, abrange parte dos bairros de Santo Cristo, Caju, Gamboa, Saúde e Centro.

Ícones culturais, como o Museu de Arte do Rio (MAR) e o Museu do Amanhã, foram incluídos no projeto. E, entre as iniciativas para modernizar os espaços públicos da região, houve a derrubada do Elevado da Perimetral, que liberou a vista da Baía de Guanabara. Em contrapartida, para garantir a circulação, estão sendo construídos 4,8 quilômetros de túneis.

Antes encoberto pela Perimetral, o trecho da Rodrigues Alves que vai do Armazém 8 do Cais do Porto até o Píer Mauá está sendo transformado em um grande passeio público arborizado, com ciclovia e faixa exclusiva para o Veículo Leve sobre Trilhos (VLT). O boulevard terá 44 mil metros quadrados, o correspondente a um terço do espaço do Parque Madureira. O projeto prevê ainda a reurbanização de vias e calçadas, além da reconstrução de redes de infraestrutura urbana (água, esgoto e drenagem).

A prefeitura também aumentou o potencial de construção de imóveis do Porto. Os interessados em erguer prédios com o gabarito acima do permitido conseguem autorização comprando Certificados de Potencial Adicional Construtivo (Cepacs). Todo o valor arrecadado é obrigatoriamente investido na região.

Fonte: O Globo


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